quinta-feira, 27 de abril de 2017

Santa Franciscana do dia - 27/04 - Santa Zita de Lucca



(1218-1278) Empregada doméstica TOF. Canonizada em 1696.

Santa Zita nasceu em 1218, na época ainda de São Francisco, em Monsagrati, nos arredores da cidade de Lucca no seio de uma família muito devota. A sua irmã mais velha entrou para um convento de Cister e seu tio foi eremita e morreu com fama de santidade.

Filha de camponeses, aos 12 anos foi trabalhar como empregada doméstica na casa de uma rica família, e aí permaneceu durante 48 anos, ou seja até morrer.

Extremamente devota, perguntava-se sempre a si mesma: “Isto agrada ao Senhor?” Ou: “Isto desagrada a Jesus?”. Esta preocupação de sempre fazer a vontade divina tornara-se para ela quase uma obsessão.

Tendo sempre, em todas as ocasiões e situações, demonstrado um grande amor para com o próximo, foi-lhe confiado o encargo de distribuir as esmolas cada sexta-feira. E dava do seu pouco, da sua comida, das suas roupas, daquilo que possuía, das suas parcas economias. Dizem que um dia foi surpreendida enquanto socorria os necessitados. Mas no seu avental o que era alimento converteu-se em flores.

Conta-se ainda que certo dia foi dar esmola a um necessitado, durante o seu tempo de trabalho. Vizinhos, tendo sido testemunhas desta “infração”, vieram logo avisar a família Fatinelli, para quem Zita trabalhava. A dona da casa foi à cozinha, para averiguar se havia atraso no afazeres e, ó milagre, alguns Anjos estavam ocupados a fazer aquilo que Zita deveria ter feito durante o tempo em que foi fazer obra de caridade. Daí em diante, nunca mais foi impedida de seguir os seus instintos caritativos.

Um outro fato que sobre ela se conta igualmente é o seguinte:

Durante um período de grande fome que assolou a região, Zita continou a praticar a caridade a que estava habituado, utilizando mesmo o que estava armazenado nos celeiros de seus patrões. Uma vez mais foi acusada, mas quando os seus patrões foram verificar os celeiros, ficaram admirados de os encontrar repletos: nada lá faltava.

Na hora da morte — aos 60 anos — tinha ajoelhada a seus pés toda a família Fatinelli, a quem servira toda a vida. Partiu para o Céu no dia 27 de Abril de 1278. O seu corpo é venerado na igreja de São  Fredaino, em Lucca, Itália. Pio XII proclamou-a padroeira das empregadas domésticas do mundo inteiro.


27/04 - Bem-aventurado Tiago de Bitetto

Religioso da Primeira Ordem (1400-1490). Clemente XI aprovou seu culto. 

Embora natural da Dalmácia, razão  pela qual às vezes é denominado também de “o Eslavo” ou “o Ilíríco”, o Beato Tiago passou a maior parte de sua existência na costa oposta do Adriático onde se tornou irmão leigo dos Frades Menores da Observância, em Bitetto, pequena cidade situada a nove milhas de Bari.
Alcançou grande santidade através de uma vida de humildade e de abnegação de si mesmo e de contemplação. Deus o favoreceu com o espírito de profecia, segundo o depoimento de um de seus confrades no processo de beatificação. Em diversas ocasiões foi visto elevado acima do chão, absorto em oração.

Durante alguns anos trabalhou como cozinheiro em outra casa da Ordem, em Conversano. A vista do fogo da cozinha levava-o, às vezes, a contemplar as chamas do inferno, e em outras ocasiões a alçar-se até o mais alto dos céus e deter-se no fogo devorador do amor eterno.
Muitas vezes caía em êxtase, enquanto executava o seu trabalho, e permanecia imóvel e absorto em Deus. Posteriormente foi transferido de volta a Bitetto, onde terminou o curso de sua vida. Muitos milagres foram atribuídos à sua intercessão. No jardim do convento de Bitetto havia um pé de junípero plantado por ele e cujos frutos, afirmava-se, possuíam propriedades curativas. Tiago foi beatificado pelo Papa Inocêncio XII.

As informações sobre Tiago de Bitetto estão contidas em Acta Sanctorum, abril, vol. III

quinta-feira, 20 de abril de 2017

Assis ganha Santuário do Despojamento de São Francisco.



“Uma nova pérola no panorama religioso de Assis”. 
Com estas palavras, o Papa Francisco define o novo Santuário do Despojamento, que será inaugurado em 20 de maio próximo. Para a ocasião, o Pontífice enviou este domingo uma mensagem ao Bispo de Assis-Nocera Umbra-Gualdo Tadino, Dom Domenico Sorrentino.

A conversão como despojamento dos bens terrenos

O Papa abençoa o novo Santuário e todos os peregrinos que apoiaram em oração, o local “onde o jovem Francisco despojou-se, até a nudez, de todos os bens terrenos, para doar-se inteiramente a Deus e aos irmãos”.

Recordando a emoção de sua primeira visita a Assis em 2013, o Papa ressalta a força evocativa do lugar em que São Francisco “se desvincula dos encantos do deus-dinheiro, que havia seduzido a sua família, em particular seu pai Pietro di Bernardone. Certamente, o jovem convertido não pretendia faltar com o devido respeito com o seu pai, mas recordou-se – escreve o Papa – que um batizado deve colocar o amor por Cristo acima dos afetos mais caros”.

E naquele local – recorda ainda o Papa Francisco de sua visita – o encontro com um representante de pobres, “testemunho da escandalosa realidade de um mundo ainda tão marcado pelo abismo entre o infinito número de indigentes, frequentemente despojados do mínimo necessário, e a minúscula porção de pessoas com posses, que detém a máxima parte da riqueza e pretendem determinar os destinos da humanidade”.

A partilha contra as iniquidades da economia

A iniquidade global, a economia que mata – sublinha o Papa – hoje como então, atingem os mais vulneráveis: os migrantes hoje, ontem os doentes de lepra. O novo Santuário em Assis – portanto – nasce como desejo de uma sociedade mais justa e solidária.

A própria Igreja – escreve o Papa – deve despojar-se da mundanidade e revestir-se dos valores do Evangelho.

Retomando as palavras pronunciadas em Assis, o Papa Francisco sublinha que “todos somos chamados a ser pobres, a despojarmo-nos de nós mesmos; e para isto, devemos aprender a estar com os pobres, compartilhar com quem é privado do necessário, tocar a carne de Cristo! O cristão não é alguém que se enche a boca com os pobres, não! É alguém que os encontra, olha em seus olhos, os toca”.

E, diante do fenômeno do afastamento da fé – sublinha – somos chamados a uma nova evangelização, que se baseie não tanto na força das palavras, mas no “fascínio do testemunho sustentado pela graça”.

O despojamento, mistério de amor

São Francisco, portanto, fez da pobreza o sinal mais evidente de penitência, de renovação e – recorda o Papa – da inspiração em Cristo, que é “o modelo original do despojamento”.

Jesus assume uma condição de servo, tonando-se igual aos homens, fazendo-se obediente até a morte de Cruz.

A Onipotência, de qualquer maneira, se oculta, para que a glória do Verbo feito carne se expresse sobretudo no amor e na misericórdia.

O despojamento é portanto – conclui Francisco – “um mistério de amor!”, mas despojamento – é a sua ressalva – não é desprezo pelo mundo, mas fruição sóbria e solidária das coisas materiais: é amor, não egoísmo. E esta é na prática a alegria evangélica do caminho cristão, que pode encontrar caminhos de saída à tristeza individualista de nosso mundo.

Na conclusão da carta, um aceno à sociedade do amanhã: os jovens. Eles – escreve o Papa – devem ser acompanhados pela luz destes valores.

Que novo Santuário do Despojamento – são os votos do Papa – seja um lugar de encontro entre jovens e adultos: uma família ideal, onde os jovens sejam ajudados no discernimento de sua vocação.

quarta-feira, 19 de abril de 2017

Catequese com o Papa: Cristo Ressuscitou dos mortos - aqui nasce a fé cristã.



Como habitualmente às quartas-feiras, também hoje o Papa Francisco teve a sua catequese geral na Praça de São Pedro. E como era de esperar falou de Cristo Ressuscitado tal como é apresentado na primeira Carta de São Paulo aos Coríntios. O cristianismo – disse Francisco – nasce com a Ressurreição de Cristo e “não é uma ideologia, não é um sistema filosófico, mas sim um caminho de fé que parte de uma acontecimento, testemunhado pelos primeiros discípulos de Jesus”.

Se Cristo não tivesse ressuscitado teríamos nele um exemplo de dedicação suprema, mas isto não poderia gerar a nossa fé. A fé nasce da Ressurreição – insistiu o Papa. Aceitar que Cristo morreu e que morreu na cruz, não é um ato de fé, é um ac
to histórico, mas acreditar que ressuscitou, sim. “A nossa fé nasce na manhã de Páscoa”.

Seguindo a Carta de Paolo aos Coríntios, o Papa faz notar que ele era um perseguidor da Igreja, um homem firme nas suas convicções, satisfeito da vida, com clara consciências dos seus deveres. Mas nesse quadro perfeito da vida, um dia acontece-lhe algo de imprevisível: a caminho de Damasco, encontra Jesus e cai do cavalo, mas não se tratou duma simples queda. Ele é apanhado por um acontecimento que muda o sentido da sua vida. E de perseguidor torna-se apóstolo. Porquê?
“Porque vi Jesus vivo! Eu vi Jesus Cristo ressuscitado! Este é o fundamente da fé de Paulo, assim como da fé dos apóstolos, como a fé da Igreja, como a nossa fé”.

O Papa chamou a atenção para a beleza de o cristianismo ser essencialmente isto: não tanto a nossa procura de Deus que na realidade é titubeante, mas sim Deus que nos procura e não nos abandona. O cristianismo – disse  - é graça, é surpresa e por isso requer um coração capaz de se maravilhar…
“um coração cerrado, um coração racionalístico é incapaz de se maravilhar, e não compreender o que é o cristianismo. Porque o cristianismo é graça, e a graça só é perceptível, só se encontra na maravilha do encontro”

Então – continuou o Papa – se somos pecadores, todos o somos, se nos sentimos falhados, tal como aqueles que foram ao sepulcro de Jesus e viram a pedra rolada – podemos ira a nosso sepulcro interior e ver como Deus é capaz de ressuscitar também ali. E então lá onde todos pensavam que só havia tristeza, trevas, insucessos, dá-se a felicidade, a alegria, a vida. “Deus faz crescer as suas flores mais bonitas no meio de pedras áridas”.

E o Papa concluiu recordando que “ser cristãos significa não partir da morte, mas do amor de Deus para connosco” E convidou, a trazermos no coração, nestes dias de Páscoa, do grito de São Paulo “Ó morte onde está a tua vitória? Onde está ó morte o teu aguilhão”. Assim poderemos responder a quem se interroga sobre o nosso sorriso, que “Jesus ainda está aqui e continua a estar vivo no meio de nós, que Jesus está aqui na praça connosco: vivo e ressuscitado” .

Depois da sua catequese em italiano, as palavras do Papa foram resumidas em francês, inglês, espanhol, alemão, polaco, e português, seguidas de uma saudação nessas línguas para diversos grupos de peregrinos presentes na Praça. Eis a saudação do Papa em língua portuguesa…

“De coração saúdo todos os peregrinos de língua portuguesa, particularmente os grupos vindos de Portugal e do Brasil. Queridos amigos, deixai-vos iluminar e transformar pela força da Ressurreição de Cristo, para que as vossas existências se convertam num testemunho da vida que é mais forte do que o pecado e a morte. 

terça-feira, 18 de abril de 2017

Franciscano do dia - 18/04 - Bem-aventurado André Hibernão


Religioso da Primeira Ordem (1534-1602). Beatificado por Pio VI no dia 22 de maio de 1791. 

André Hibernão descendia de nobre linhagem espanhola, mas seus pais, que viviam em Alcantarilla, perto de Múrcia, eram tão pobres, que o rapaz se empregou ainda muito jovem junto a um tio, para ajudar no sustento da família. Ele havia juntado pouco a pouco uma quantia suficiente para garantir um dote para a irmã e o levava em triunfo para casa, quando foi assaltado por dois ladrões que o privaram de tudo.

Amargamente desiludido, ele começou então a dar-se conta da precariedade das riquezas terrenas em comparação com os tesouros do céu, que são eternos. Entrou em uma casa dos franciscanos conventuais que deixou pouco depois, passando à reforma alcantarina, onde professou como irmão leigo. Procurou levar uma vida oculta de modéstia, humildade e oração, mas aprouve a Deus glorificá-lo, concedendo-lhe o dom da profecia e dos milagres. Muitos lhe deveram a conversão.

O santo homem predisse o dia de sua morte, que se deu em Gândia, quando ele contava 68 anos de idade. S. Pascal Baílão e o Beato João de Ribera propagaram o nome de André, mas ele já era localmente venerado como santo ainda em vida, e foi beatificado em 1791.
Há uma vida escrita pelo Pe. Vicente Mondina, postulador da causa, Vita del B. Andrea Ibernon (1791), e veja-se também Léon, “Auréole Séraphique” (trad. para o inglês), vol. II, p. 77·83.

sexta-feira, 14 de abril de 2017

Os últimos momentos de Jesus no alto da Cruz




Por Frei Ludovico Garmus

Introdução

Durante a Semana Santa a liturgia prevê, no Domingo de Ramos, a leitura da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo Mateus e na Sexta-Feira Santa a de João.
As narrativas da Paixão têm basicamente o mesmo esquema e conteúdo nos quatro evangelhos, embora cada evangelista tenha algo de próprio no conteúdo, na disposição do material e nos acentos teológicos próprios.

No presente estudo, “Os últimos momentos de Jesus no alto da cruz”, vamos analisar apenas uma pequena parte da narrativa da Paixão

- a crucifixão de Jesus: Mc 15,22-32; Mt 27,33-44;
Lc 23,33-43; Jo 19,17-24;
- a morte de Jesus: Mc 15,33-41; Mt 27,45-55; Lc 23,44-49; Jo 19,29-37;

Alguns pesquisadores pensam que o primeiro evangelho, o de Marcos, tenha começado a ser escrito pela parte final, isto é, pela última semana de Jesus em Jerusalém. Marcos seria um relato da paixão com uma ampla introdução. Em outras palavras, o evangelho se desenvolveu a partir da narrativa da paixão de Cristo, já existente, ao menos em forma oral. A pregação inicial feita pelos apóstolos aos poucos deve ter criado esquemas fixos. Tais esquemas serviam para fazer o querigma, ou anúncio ao povo, isto é, aos judeus que ainda não criam em Jesus e, depois, aos pagãos. 
O esquema destas pregações corresponde basicamente aos futuros evangelhos. Destacamos apenas dois textos:

- 1Cor 15,3-5: “Eu vos transmiti, em primeiro lugar, o que eu mesmo recebi: que Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras; que foi sepultado; que ressuscitou ao terceiro dia, segundo as escrituras; que apareceu a Cefas e depois aos Doze”.
- At 10,36-38: “Vós sabeis o que aconteceu em toda a Judéia, começando pela Galiléia, depois do batismo pregado por João. Como Deus ungiu Jesus de Nazaré com o Espírito Santo e com poder. Como ele andou fazendo o bem e curando todos os oprimidos pelo diabo, porque Deus estava com ele”.

Como se vê, tanto a anúncio de Paulo como o do discurso de Pedro começam pela recordação da morte de Jesus. No discurso de Pedro, se o v. 36 for invertido em sua seqüência, temos o esquema geográfico do evangelho de Marcos: “o que aconteceu na Judéia” (Mc 11,1-16,8), “começando pela Galiléia” (Mc 1,14-10,52), “depois do batismo pregado por João” (Mc 1,1-13). Tanto o querigma primitivo como a celebração da ceia nas casas pode ter contribuído para a formulação das narrativas da paixão/ressurreição de Jesus. A obediência à ordem de Jesus, “fazei isto em memória de mim” (cf. 1Cor 11,23-24: Lc 22,19), foi a situação vital que favoreceu a elaboração, inicialmente, do relato da paixão/ressurreição e depois do restante do evangelho. Não é de estranhar que o relato da ceia tenha se tornado uma introdução ao relato da paixão propriamente dita.

Com o querigma, feito aos de fora, os cristãos precisavam justificar por que anunciavam e seguiam um Messias crucificado, “escândalo para os judeus, loucura para os gregos” (1Cor 1,23). Dentro da comunidade reunida para celebrar a ceia ou para a catequese precisavam entender, à luz das Escrituras, este “escândalo da cruz”; precisavam entender, à luz dos profetas, “que era necessário que o Cristo sofresse tudo isso para entrar na sua glória” (Lc 24,25-26). Daí a centralidade que as narrativas da paixão/ressurreição ocupam nos Evangelhos.

Marcos parece ter sido o primeiro a reunir e ordenar o material da história da paixão, antes contado oralmente. Depois de Marcos, Mateus e Lucas refundiram seu relato da paixão segundo suas perspectivas teológicas próprias. De fato, em nenhuma outra parte dos evangelhos há tanta coincidência dos evangelistas como nas narrativas da paixão, sobretudo, a partir da prisão de Jesus (cf. Mc 14,43 e paralelos) e, particularmente, da história da crucifixão.


1. A crucifixão

Marcos, na cena da crucifixão menciona o local (Gólgota), a oferta de vinho com mirra, a repartição das vestes por sorteio, a inscrição sobre a cruz e, por fim, os dois bandidos que com Jesus foram crucificados.
 Mateus menciona os mesmos fatos, precisando que o vinho foi misturado com fel e que havia ali guardas sentados, vigiando Jesus. Algumas mulheres, que seguiram Jesus desde a Galiléia (cf. Mc 15,41), provavelmente, prepararam uma bebida que causava torpor, como era costume oferecer aos condenados. Em Pr 31,4-6 se aconselha que os governantes se abstenham de vinho e licores, “para não esquecer as leis e descuidar do direito de todos os pobres”, mas recomenda: “Que se dê licor ao que vai morrer e vinho aos amargurados”. Jesus, porém, se nega a beber, para enfrentar o sofrimento e a morte conscientemente. No Getsêmani, Jesus estava disposto a beber o cálice do sofrimento até o fim (Mc 14,36).

A repartição das vestes dos condenados à morte entre os que executavam a sentença estava prevista nas leis romanas. Mas a Igreja primitiva, que lia o Sl 22 para expressar a paixão de Jesus, viu no sorteio das vestes o cumprimento de uma profecia: “Repartem entre si minhas vestes e sobre minha túnica lançam a sorte” (Sl 22,19). João diz que as vestes foram divididas em quatro partes pelos soldados e somente a túnica sem costura foi sorteada.

Lucas omite na cena da crucifixão a oferta da bebida e a inscrição sobre a cruz, definindo o motivo da condenação. Lembra, porém, que junto com Jesus foram crucificados dois “criminosos” (em vez de bandidos de Mt e Mc), talvez relendo Is 53,12: “entregou sua vida à morte e se deixou contar entre os criminosos”. Lucas é o único a citar, no contexto da crucifixão, uma oração de Jesus pedindo perdão: “Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem” (23,34). “A primeira palavra de Jesus na cruz foi uma palavra de perdão” (Lagrange). Este pedido de perdão poderia se referir aos soldados romanos. Mas, à luz de At 3,17.19 e da oração de Santo Estevão (At 7,59-60), é mais provável que Jesus estivesse pensando nas autoridades judaicas que causaram sua condenação. No momento supremo de sua vida e missão, Jesus dá o exemplo do perdão do qual falava (Lc 6,27-36; 17,3; cf. Is 53,12) e incluiu na oração do Pai Nosso (11,4).

João cita a oferta da bebida só mais tarde (19,29), mas insiste na inscrição “Jesus Nazareno, o rei dos judeus”, escrita em hebraico, grego e latim. Os sumos sacerdotes reclamaram com Pilatos e queriam que a inscrição fosse modificada: em vez de “Jesus Nazareno, rei dos judeus” para “eu sou o rei dos judeus”. Mas Pilatos respondeu com a famosa frase: “O que escrevi, está escrito”. Jesus foi acusado de pretender ser um messias, rei dos judeus. Mas já no processo João rebate esta acusação: o reino de Jesus não é deste mundo (Jo 18,33-38; cf. Mc 15,2 e paralelos)].

2. Os insultos e os dois bandidos

Marcos e Mateus dividem os que insultam Jesus na cruz em três grupos: os que passavam perto do Gólgota, os sumos sacerdotes, escribas e anciãos e, finalmente, os dois bandidos crucificados. Em Marcos, os insultos giram em torno do título Messias-Rei. Os passantes retomam a falsa acusação feita contra Jesus de que Jesus prometeu destruir o Templo e desafiam-no a descer da cruz, salvando-se a si mesmo (Mc 14,58; 15,19), já que é tão poderoso; ao dizer isso eles “movem a cabeça”, como no Sl 22,8 e em Lm 2,15. De fato, Jesus havia salvado muitas pessoas, curando-as. Mas também havia dito: “Quem quiser salvar sua vida vai perdê-la…” (Mc 8,35). Os escribas e sumos sacerdotes repetem o insulto e acrescentam que, se o “Cristo, rei de Israel”, descesse da cruz, até eles haveriam de crer nele (Mc 15,32; Mt 27,42b). Lucas afirma que os soldados, ao oferecerem vinagre a Jesus, diziam: “Se és o rei dos judeus, salva-te a ti mesmo”, lembrando que acima da cabeça de Jesus estava escrito: “Este é o rei dos judeus” (Lc 23,36-38).

Os insultos dirigidos a Jesus na cruz lembram Sb 2,17-20 e Sl 22,7-9. Mesmo desafiado, Jesus nega-se a usar de seu poder para descer da cruz. Já na tentação do deserto (Lc 4,3.9) “Jesus havia feito sua opção definitiva entre demonstrar seu poder e entregar-se totalmente em obediência ao Pai” (Hendrickx: 1986, p. 155).

Marcos e Mateus dizem que também os dois bandidos crucificados participavam dos insultos. Lucas distingue: Apenas um dos criminosos blasfemava, dizendo: “Não és tu o Cristo? Salva-te a ti mesmo e a nós” (Lc 23,39). O outro, porém, o repreendeu, dizendo que, se eles mereceram o castigo, Jesus era inocente e lhe fez um pedido: “Jesus, lembra-te de mim quando vieres como rei”. E Jesus respondeu: “Ainda hoje estarás comigo no paraíso”. O criminoso pensa, como os judeus em geral, na felicidade futura. Para Jesus, porém, a esperança da salvação futura é uma salvação que já se experimenta hoje (cf. Lc 2,11; 4,21; 19,9). No Antigo e no Novo Testamento, a essência da felicidade é estar com Deus.

3. Os sinais precursores da morte de Jesus

Marcos e Mateus citam dois sinais precursores: as trevas e o véu do Templo que se rasga. As trevas teriam coberto sobre toda a terra desde a hora sexta, meio-dia, até a hora nona, três da tarde. Não se trata de procurar uma explicação natural, como um eclipse ou o vento siroco, que pode trazer tanta poeira do deserto a ponto de fazer escurecer o céu. O fenômeno sugere um efeito cósmico da morte de Jesus e faz parte da linguagem escatológica do dia do Senhor e do julgamento divino, por ocasião da vinda do Filho do Homem: “Naqueles dias… o sol escurecerá” (Mc 13,24). Ou como diz Amós: “Acontecerá naquele dia que farei o sol se pôr em pleno meio-dia e escurecerei a terra em um dia de luz” (Am 8,9). Em João a paixão é também entendida como um julgamento divino: “Agora é o julgamento do mundo” (Jo 12,31).

4. Palavras de Jesus e intervenção do soldado

Apenas Marcos e Mateus dizem que Jesus, com voz forte gritou: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” O grito de Jesus, citando o Sl 22,1, expressa a radical solidão do sofrimento e morte de Jesus. Não se trata de um grito de desespero de um moribundo, mas inclui também uma expressão radical de entrega a Deus, como se expressa na ação de graças e certeza da proteção divina da parte final do Sl 22,22-31. Neste sentido, alguns pensam que Jesus estivesse rezando o Salmo 22. Talvez para ressaltar o aspecto positivo e confiante Lucas, omite este grito. O grito de Jesus chamou a atenção dos soldados e um deles, entendo mal a expressão “meu Deus” (Eli ou Eloí), disse: “Vede! Ele está chamando Elias”. Elias era considerado o precursor do Messias (cf. Ml 3,23; Mc 9,11-13). Foi arrebatado ao céu num carro de fogo (2Rs 2,11-14) e se acreditava que, ao ser invocado, viria resgatar o justo necessitado.

Com Lucas, João omite o grito de abandono do Sl 22,1; em vez disso, mostra que nem todos abandonaram o Mestre: Junto à cruz “estavam de pé, sua mãe, a irmã de sua mãe, Maria de Cléofas e Maria Madalena”, além do discípulo amado (Jo 19,25-27). João, em vez de um Jesus abandonado pelo Pai, mostra um Jesus preocupado com o possível abandono de sua mãe, após sua morte. Por isso, com as palavras “mulher, aí está o teu filho” e “aí está tua mãe”, confia-a aos cuidados do discípulo amado.

5. A morte de Jesus e repercussões

Depois desta cena, Marcos e Mateus lembram que Jesus deu mais um forte grito e expirou. Em Lucas, que omitiu o Sl 22,1 (“meu Deus, meu Deus por que me abandonaste?”), antes de expirar, Jesus diz: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito”, citando o Sl 31,6. Como nos salmos, Jesus aparece como o justo que sofre, mas se entrega confiante a Deus e é reabilitado. João mostra um Jesus consciente até o fim; por isso, “para cumprir plenamente a Escritura”, diz: “Tenho sede”. Neste momento, um dos soldados, molha em vinagre a esponja presa numa vara e a aproxima da boca de Jesus. Ao contrário de Mc 15,23 e Mt 27,34, Jesus provou o vinagre: “Depois de provar o vinagre, Jesus disse: ‘tudo está consumado’. E, inclinando a cabeça, entregou o espírito” (Jo 19,28-30).

A expressão “tenho sede”, no contexto do vinagre servido, lembra o lamento do justo sofredor do Sl 69,22: “Puseram veneno no meu alimento, em minha sede deram-me a beber vinagre”. A palavra “tudo está consumado” expressa o desejo profundo de Jesus de cumprir a vontade do Pai. A cena de Jesus e a samaritana junto ao poço de Jacó já expressava muito bem este desejo. De fato, embora Jesus tenha pedido água para a samaritana acabou não bebendo água; e, quando os discípulos lhe oferecem pão, Jesus diz: “Meu alimento é completar é fazer a vontade daquele que me enviou e completar a sua obra” (Jo 4,34). Do mesmo modo, na hora da prisão, Jesus manda Pedro recolher a sua espada e diz: “Será que não devo beber o cálice que o Pai me deu?” (Jo 18,11). Por outro lado, como em Lc 23,46, em João ninguém tira a vida de Jesus. É ele que “entrega” o seu espírito: “O Pai me ama porque dou minha vida para de novo a retomar. Ninguém a tira de mim. Sou eu mesmo que a dou” (Jo 10,17-18).

6. Ocorrências após a morte de Jesus

Marcos mostra um duplo significado da morte de Jesus. A ruptura do véu (v. 38) tem um significado em relação ao povo judeu e a confissão do oficial romano (v. 39) se relaciona com os gentios. Em Mateus e Marcos o véu do Templo se rompe após a morte de Jesus, enquanto em Lucas, antes da morte. No Templo havia dois véus. Um véu exterior, que separava o Santo do pátio exterior (Ex 26,37; 38,18) e um véu interior, que separava o Santo do Santíssimo . Em qualquer caso, se os evangelhos sinóticos mencionam a ruptura do véu (interior ou exterior) no contexto do momento da morte de Jesus é porque isso tinha um significado simbólico mais profundo. Poderia significar que, com a morte de Jesus, o serviço do Templo fica abolido e sua destruição está próxima. Outros vêem na ruptura o fim da barreira entre Deus e o homem (cf. Hb 9,1-12.24-28; 10,19-25). Outra possibilidade seria que, com a morte de Jesus, acaba a separação entre judeus e gentios (cf. Ef 2,11-22). Em suma, a morte de Jesus marca o fim da economia do Antigo Testamento e abre o caminho da salvação para todos os povos.

Segundo Mateus, a ruptura do véu foi acompanhada de outros fenômenos cósmicos: “A terra tremeu e fenderam-se as rochas. Os túmulos se abriram e muitos corpos de santos ressuscitaram. Eles saíram dos túmulos, depois da ressurreição d’Ele, entraram na Cidade Santa e apareceram a muitos” (27,51b-3). A descrição se inspira no motivo apocalíptico da ressurreição, prevista para a era messiânica (cf. Ez 37,1-14). Na linguagem apocalíptica o terremoto acompanha a descrição de teofanias, ou manifestações divinas, como sinal de uma nova ação salvífica (cf. Jl 2,10; Ag 2,6.21).

Por outro lado, a ruptura de rochas também acompanha a própria ação divina (Is 48,21; Na 1,5-6). Tumbas que se abrem marcam a descrição da ressurreição do povo em Ez 37,12s. “Santos” no Sl 34,9 é sinônimo de fiéis. Os rabinos chamam “santos” os que observam os mandamentos divinos. Em Mt 27,52 talvez se refira a personagens importantes do Antigo Testamento. A ressurreição dos mortos é o ato salvífico escatológico de Deus por excelência. Jerusalém com seu templo era o lugar da presença de Deus. Aqui, a expressão “Cidade Santa” indica a Jerusalém celeste (Hb 11,10.16; 12,22; Ap 21,2.10; 22,19. Enfim, todos estes sinais não devem ser entendidos literalmente, mas são afirmações teológicas para expor o significado da morte de Jesus. “Depois da ressurreição d’Ele”, talvez seja um acréscimo para deixar claro que “Cristo ressuscitou dos mortos como o primeiro dos que morreram” (1Cor 15,20) e na sua ressurreição se baseia a fé na ressurreição dos mortos (1Cor 15,12-19).

À vista destes fenômenos cósmicos, Marcos e Mateus trazem a confissão do centurião romano: “Verdadeiramente, este homem era Filho de Deus”. Marcos põe na boca do centurião aquilo que mais tarde faria parte da confissão cristã a respeito de Jesus. Com esta frase o centurião caracteriza a vida inteira de Jesus, até sua morte, como a de filho de Deus (cf.Mc 1,1 e 15,39). A expressão “filho de Deus” ainda não é o que entendemos por ” segunda pessoa da Trindade”, definição que foi feita apenas em 325 dC, no Concílio de Nicéia. 

No Antigo Testamento o povo de Israel era chamado filho de Deus: “Quando Israel era menino, eu o amei e do Egito chamei o meu filho” (Os 11,1). O rei, como representante do povo, era também chamado “filho” de Deus (2Sm 7,12-16). À luz do Sl 2,7, ‘filho de Deus” pode ser entendido mais em sentido messiânico. A confissão do centurião, de qualquer forma, vai mais longe que a de Pedro, que reconhece em Jesus apenas o Cristo (Mc 8,29) e afirma o que o sumo sacerdote considerou como blasfêmia (Mc 14,64). Em João, o próprio Jesus, ao discutir com os judeus, diz: “Se a Lei chama deuses àqueles a quem se dirigiu a palavra de Deus – e a Escritura não pode falhar – como podeis dizer que blasfema aquele que o Pai santificou e enviou ao mundo só porque eu disse: ‘Sou Filho de Deus’” (Jo 10,35-36). Marcos quer deixar claro à comunidade cristã que somente quando Jesus é visto como aquele que sofreu, morreu, ressuscitou e há de vir de novo, é que pode ser chamado filho de Deus em sentido próprio (Hendrickx: 1986, p. 130-131).

Mateus coloca o reconhecimento de que Jesus era filho de Deus na boca do centurião e dos guardas que com ele estavam. Esta confissão é acompanhada pelo temor diante de uma manifestação divina: “ficaram com muito medo” (27,54: 9,8; 17,6). Em Mateus Jesus é reconhecido como “filho de Deus” já antes pelos discípulos, quando Jesus caminha sobre as águas ao encontro dos discípulos em meio ao mar agitado (Mt 14,33). Em Cesaréia de Filipe, Pedro também confessa que Jesus é “o Cristo, o Filho do Deus vivo” (16,16). E agora, junto à cruz, ao reconhecer que Jesus era filho de Deus, enquanto os chefes do povo o rejeitavam, o centurião romano torna-se um exemplo de profissão de fé para a comunidade cristã de Mateus. Jesus já havia elogiado esta fé num centurião romano que pedia a cura de seu servo: “Em ninguém de Israel encontrei tanta fé” (Mt 8,10-12).

Em Lucas o centurião diz: “Realmente, este homem era um justo”. Pilatos e o criminoso declararam que Jesus era inocente. O texto de Lucas parece sugerir que o centurião, tendo acompanhado todo o processo diante de Pilatos (23,2-25) e vendo a acontecido, reconhece que Jesus não tinha ambições políticas de que era acusado, mas era um justo. Em Lucas, o centurião reconhece que Jesus era um justo enquanto “glorificava” a Deus. Em outras ocasiões, em Lucas, o “louvor” ou a “glorificação” é a resposta cristã diante de palavras e gestos de Jesus. A glorificação é a resposta de quem crê que Deus interveio de modo decisivo na história da salvação (Lc 1,42.64; 2,20.28; 17,15, etc.). O título “justo” lembra o sofredor que é reabilitado como justo (Sl 31,19). Para Lucas “justo” é um título messiânico (At 3,14-15; 3,14; 7,52; 22,14) e lembra o servo sofredor de Isaías: “O justo, meu servo, justificará a muitos e tomará sobre si as suas iniqüidades” (Is 53,11). Além das palavras do centurião, Lucas acrescenta que a multidão, testemunha do que aconteceu, volta arrependida, “batendo no peito”. Pode ser uma alusão a Zc 12,1.10 onde, diante do “transpassado” que morre, o povo se arrepende e faz lamentação. Pode-se também ver uma antecipação do dom do Espírito e do perdão, conforme At 2,38: “Arrependei-vos e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo para o perdão dos pecados, e recebereis o dom do Espírito Santo”.

7. Mulheres e outros que estavam presentes

No jardim de Getsêmani, quando Jesus é preso, todos os discípulos o abandonam. Um discípulo jovem tentou segui-lo, mas também acaba fugindo (Mc 14,50-51). Pedro, que jurara permanecer fiel, acompanha Jesus, junto com outro discípulo, até a casa do sumo sacerdote, mas acaba negando que conhece o Nazareno. João é o único que fala de um discípulo, o discípulo amado, presente junto à cruz. Marcos e Mateus, com algumas variantes, dizem que as mulheres presentes eram muitas, seguiam Jesus e o serviam desde a Galiléia, e mencionam Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago e de José, a mãe dos filhos de Zebedeu (Mt) e Salomé (Mc).Lucas não cita nomes, mas, em outro lugar, identifica pelo nome estas mulheres que seguiam e serviam a Jesus desde a Galiléia: Maria Madalena, Joana, mulher de Cuza e Susana, além de “muitas outras” (cf. Lc 8,2-3).

Acrescenta, porém, que estavam junto à cruz “todos os conhecidos de Jesus”. Logo, também os onze discípulos estariam presentes, à distância, como testemunhas da morte de Jesus.O vínculo entre o mestre e os discípulos não estaria de todo rompido. De fato, Lucas omite a fuga dos discípulos e lembra que “Pedro o seguia à distância” (Hendrickx: 1986, p. 163-164). João é o único a dizer que “junto à cruz estavam de pé sua mãe, a irmã de sua mãe, Maria de Cléofas e Maria Madalena”, além do discípulo que Jesus amava (Jo 19,25-26).
A presença das mulheres junto à cruz é mencionada em Marcos, Mateus e Lucas porque elas exercem uma função importante no sepultamento e no encontro do túmulo vazio (Mc 15, 47-16,8; Mt 27,61; 28,1-10; Lc 23,55-24,1-11).

Conclusão

Como vimos acima, Marcos recolheu materiais do relato da paixão, anteriores a ele, e foi o primeiro a organizá-los, dando-lhes alguns acentos teológicos próprios. Mateus e Lucas (e de certa forma João) respeitaram estes dados da tradição oral e acolheram a organização que lhes foi dada por Marcos. Também eles têm seus acentos teológicos próprios.
Marcos tem uma reflexão cristológica própria. Jesus é um inocente, crucificado como Messias, “rei dos judeus” (Mc 15,2.9.12.18.26). Provavelmente, ao falar do silêncio de Jesus e de sua inocência, esteja fazendo uma alusão aos cânticos do Servo Sofredor (Is 53,7.9). Realça o contraste entre Jesus e Barrabás, e a crescente solidão e rejeição de Jesus. No seu relato fica, também, clara a responsabilidade dos judeus (Mc 15,3-14). O julgamento de Jesus diante de Pilatos é um julgamento do rei dos judeus, que silencia enquanto os judeus o acusam (Hendrickx: 1986, p. 92-93).
Mateus dá também destaque ao aspecto cristológico, insistindo na fé e no título “filho de Deus” (Mt 27,40.43.54). O relato de Mateus tem uma característica fortemente eclesial (Hendrickx: 1986, p. 149). A morte de Jesus marca o fim da antiga aliança e o começo do novo povo de Deus (Mt 27,51-54). Com Marcos, frisa também ferrenha oposição dos chefes judeus e sua responsabilidade pela morte de Jesus.

Lucas dá um realce ao amor de Jesus pelos pecadores, tanto na cruz como durante seu ministério público, e à firma confiança na proteção do Pai (Hendrickx: 1986, p. 164). Jesus não é alguém abandonado e rejeitado por todos. No caminho da cruz, recebe a solidariedade de Simão Cireneu, é seguido por uma multidão de povo e mulheres, que se compadecem dele e as quais Jesus exorta. Em lugar de “bandidos” que amaldiçoam a Jesus, aparece um “criminoso” arrependido e que recebe a promessa de estar na presença de Deus (Lc 23,39-43). Lucas substitui o grito de abandono de Jesus – “meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” (Sl 22,2) – pelo de confiança: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito” (Sl 31,6). Lucas não fica no aspecto escatológico dos sinais após a morte de Jesus, mas acentua a relação pessoal de um centurião que declara Jesus como um justo e da multidão que, arrependida, bate no peito (Lc 23,47-48).

Como vimos, cada um dos evangelistas tem o seu modo próprio de contar a paixão. Que eles nos inspirem a meditarmos e vivermos com maior profundidade a paixão e morte de Jesus, nas celebrações da Semana Santa.

Bibliografia:
BURNIER, Martinho Penido. Perscrutando as Escrituras, fasc. IX: Paixão e ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo (III). Círculos Bíblicos. Petrópolis: Ed. Vozes, 1971, 203 p.
GOURGUES, M. Jesus diante de sua paixão e morte. Cadernos Bíblicos, 24. São Paulo: Paulinas, 1985, 80 p.
HENDRICKX, Herman. Los relatos de la pasión. Madrid: Ediciones Paulinas, 1986, 228 p.
KONINGS, Johan. Sinopse dos Evangelhos de Mateus, Marcos e Lucas e da “fonte Q“. Bíblica Loyola, 45. São Paulo: Ed. Loyola, 2005.

quarta-feira, 12 de abril de 2017

Papa na audiência - “O amor é o motor que move a nossa esperança”.



Cidade do Vaticano – Nesta Quarta-feira Santa (12/04), o Papa concedeu audiência geral aos fiéis na Praça São Pedro. Sol e temperatura de primavera aqueceram o encontro e, em sua catequese, Francisco recordou o ingresso de Jesus em Jerusalém, celebrado no Domingo de Ramos. “Quem podia imaginar que aquele que entrou triunfante na cidade teria sido humilhado, condenado e morto na cruz?”, questionou Francisco aos fiéis. “As esperanças daquele povo se desmancharam diante da cruz; mas nós cremos que precisamente Nele, crucificado, a nossa esperança renasceu. Que esperança é essa?”.

A frase que pode nos ajudar a entender esta esperança foi pronunciada justamente por Jesus depois de entrar em Jerusalém: “Se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; mas se morrer, dá muito fruto”.

Jesus, explicou o Papa, trouxe ao mundo uma nova esperança, com o formato de uma semente: se fez pequeno, como um grão de trigo; deixou a sua glória celeste para vir entre nós: “caiu na terra”. Mas não era suficiente. “Se alguém de vocês me perguntar: como nasce a esperança? Da cruz. Olhe para a cruz, olhe para cristo crucificado e dali virá a esperança que jamais desaparece.” 


A transformação da Páscoa

Para produzir fruto, Jesus viveu o amor até o fim, deixando-se romper pela morte como uma semente sob a terra. Justamente ali, no ponto extremo do seu abaixamento – que é também o ponto mais alto do amor – brotou a esperança. Assim, na Páscoa, Jesus transformou o nosso pecado em perdão, a nossa morte em ressurreição, o nosso medo em confiança. Esta é a transformação da Páscoa. “Eis o porquê ali, sobre a cruz, nasceu e renasce sempre a nossa esperança.”

“A esperança supera tudo, porque nasce do amor de Jesus”, prosseguiu Francisco. Quando escolhemos a esperança de Jesus, aos poucos descobrimos que o melhor modo de viver é o da semente, do amor humilde. Não há outro modo de vencer o mal e dar esperança ao mundo.


Cruz: única lógica que pode vencer o mal

Parece uma lógica falida, porque quem ama perde poder. Já para nós, possuir sempre nos leva a querer sempre mais. “Quem é voraz jamais está satisfeito”, recordou o Papa. E Jesus diz de modo claro: “Quem ama a própria vida a perde”, ou seja: quem ama o próprio e vive por seus interesses, se enche de si e se perde. Quem ao invés aceita, é disponível e serve os outros, salva si mesmo e se torna semente de esperança para o mundo.

Contudo, a cruz é uma passagem obrigatória, mas não é a meta: a meta é a glória, como nos mostra a Páscoa. É como uma mulher que, para dar à luz, sofre no parto. “É o que fazem as mães: dão outra vida. Sofrem, mas ficam felizes porque dão outra vida, dão sentido à dor. O amor é o motor que move a nossa esperança”, repetiu três vezes Francisco, que concluiu:


 Lição de casa: contemplar o Crucifixo

“Queridos irmãos e irmãs, nesses dias deixemo-nos envolver pelo mistério de Jesus que, como grão de trigo, morrendo nos doa a vida. Ele é a semente da nossa esperança. Quero lhes dar uma lição de casa: Nos fará bem contemplar o Crucifixo e dizer-lhe: Contigo nada está perdido. Contigo posso sempre esperar. Tu és a minha esperança”. E convidou os fiéis a repetirem a última frase juntos: “Tu és a minha esperança”.



terça-feira, 11 de abril de 2017

Artigo - A Paixão de Cristo em Francisco.



Por Frei Mauro Strabeli


A encarnação do Verbo está ligada, para São Francisco, a outro grande mistério: Jesus Crucificado. Com o "mistério de Jesus Crucificado", Francisco entra na mais alta contemplação da Trindade.

A vocação de Francisco nasce do chamamento a ele feito pelo Crucificado de São Damião. Ao Crucificado ele vai identificar-se tanto, a ponto de trazer dele os estigmas da crucifixão.

A Cruz é, para São Francisco, o sinal do despojamento total do homem para encher-se de Deus.

A meditação e a contemplação de Jesus Crucificado foram experiências que São Francisco foi buscar na própria Palavra de Deus. Parte ele do exemplo do próprio Cristo: "Ele tinha a condição divina, mas não se apegou à sua igualdade com Deus. Pelo contrário, esvaziou-se a si mesmo, assumindo a condição de servo... humilhou-se a si mesmo, tornando-se obediente ate a morte, a morte de cruz!" (Fl 2,6-11).

E o próprio Cristo recomenda a Cruz como caminho de seguimento: "Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome cada dia a sua cruz e me siga..." (Lc 9,23). O Novo Testamento coloca na "loucura da cruz" a razão do "ser cristão": "Fui morto na cruz com Cristo. Eu vivo, mas já não sou eu que vivo, pois é Cristo que vive em mim. E esta vida que agora vivo, eu a vivo pela fé no Filho de Deus que me amou e se entregou por mim" (Gl 2,19). "Quanto a mim, que eu não me glorie a não ser na cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo, por meio do qual o mundo foi crucificado para mim e eu para o mundo" (Gl 6,14). "Pois a linguagem da cruz é loucura para aqueles que se perdem. Mas para aqueles que se salvam, para nós, é poder de Deus... Os judeus pedem sinais e os gregos procuram a sabedoria; nós, porém, anunciamos Cristo crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os pagãos" (ICor 1,18.22-23).

E o que é a Cruz para São Francisco? O que é, para ele, Jesus Crucificado? Certamente não é por masoquismo que São Francisco faz da cruz um ponto referencial na sua leitura da Palavra de Deus. Pelo contrário. Amou a cruz por uma compreensão profunda do seu significado e do seu "mistério" - tão desconhecido por nós.

"A cruz, diz J.C.C. Pedroso, deve ser o mais antigo e mais difundido símbolo humano de que se tem conhecimento, muito antes da vinda de Cristo na carne. Nós a encontramos nas seculares mandalas do Tibete, nos tapetes da Pérsia, nos desenhos e na arquitetura de todos os povos. Achamos a coisa mais natural reforçar nossos móveis e construções com barras cruzadas ou assinalar nossas opções no papel com uma cruzinha. Justamente porque está no âmago da nossa natureza enfrentar o corte e o cruzamento que simbolizam a tensão entre os opostos...

A cruz é o símbolo que melhor expressa a união dos opostos que precisa acontecer em toda vida saudável e madura. A cruz é um símbolo muito positivo quando consideramos a vida nova que dela brota. Sem a cruz não pode haver crescimento no amor ou maturidade, nem plenitude ou equilíbrio, nem vida e energia, nem relacionamento pessoal entre Deus e a humanidade.
O amor, a plenitude e a santidade só se tornam autênticos e ativos na presença de uma tensão sempre crescente".

Foi isso que São Francisco compreendeu. Esse foi o significado que ele intuiu no mistério da cruz. Ele entendeu que a vivência em plenitude da Palavra de Deus e de seu Projeto só seriam possíveis mediante a tensão pessoal, uma catarse às vezes duramente conseguida, um conflito entre o querer o bem e se inclinar para o mal.

A cruz é, então, o instrumento de purificação, de realização, de plenitude. A cruz não foi loucura para ele; foi símbolo de purificação e símbolo da dor também. Ela significa luta, sofrimento e até a morte. A crucifixão de Jesus representa o gesto de imenso amor de Deus que, para ser solidário conosco, assume a cruz, os sofrimentos, para ensinar que só dessa fonte é que jorra vida plena.

Jesus viveu o dilema de fugir do sofrimento: "minha alma está numa tristeza de morte... Meu Pai, se é possível, afaste-se de mim esse cálice" (Mt 26,38-39a). Mas, como homem total, assumiu a sua condição: "Contudo, não seja feito como eu quero, e sim como tu queres" (Mt 26,39b). Este gesto maravilhoso de amorosa submissão à vontade do Pai, sem valer-se de sua condição divina, faz de Jesus, o homem verdadeiro: assumiu a condição de servo (Fl 2,7). "A cruz é mistério... Simboliza, com suas duas traves que se atravessam, a dilaceração do cristão entre Deus e a humanidade, entre o bem e o mal, como todas as outras tensões da vida.

Francisco expressou isso muito bem em sua famosa exclamação: "O amor não é amado!". A cruz não é para São Francisco o que é para nós: sinal de glória, de honra, ou símbolo cultural. Era, sim, instrumento de real e profunda meditação e contemplação, pois resume em si toda a ambivalência humana, toda tensão, toda procura, todo crescimento, toda realização, toda a vida.

"A cruz é a chave da história humana e da história de cada um". Parece ser esse o sentido de toda a meditação de São Francisco sobre a Paixão do Senhor, bem como o sentido da VIA SACRA, instituição devocional bíblica, sem dúvida, inspirada na sua espiritualidade.

Extraído do livro "Leitura Franciscana da Bíblia", de Frei Mauro Strabeli, OFMCap - Centro Franciscano de Espiritualidade.

sexta-feira, 7 de abril de 2017

Artigo - Dos que estão jogados à beira do caminho.



Reflexão sobre o Sagrado Coração de Jesus para a 1ª Sexta-feira do Mês


Frei Almir Guimarães

      O Papa Francisco tem insistido muito no tema da misericórdia. Em suas homilias e intervenções não cessa de voltar ao assunto. Quando falamos em misericórdia  pensamos nas posturas  delicadas, carinhosas de Jesus em seu modo de agir:  proximidade do que é frágil, um  voltar-se interior  para os que estão sem ânimo, jogados à beira do caminho, viúvos, órfãos, cegos, rejeitados, pecadores.  Contemplamos sempre a paisagem da cruz: o mais belo dos filhos dos homens tendo seu peito aberto, seu coração exposto, para dizer que não existe maior amor do que dar a vida pelos seus, que o sentido de nossa vida é dar vida, semear vida, ter um coração aberto para os outros, alimentar com a água do Coração de Jesus todos esses. Os que estão jogados à margem da vida necessitam do coração daqueles que são tocados pelo amor do Coração do Redentor.  O  Coração aberto de Jesus sobre a cruz pede que  nosso coração continue a manifestar amor.

     São muitos os que estão jogados à beira da vida: crianças que não têm pai e mãe valentes, unidos, amorosos;  velhos jogados em  fétidos hospitais;  mulheres mal amadas por seus maridos e exploradas pela vida;  presidiários que  já deveriam estar em liberdade;  moços e moças homoafetivos que são rejeitados e mortos;   seres da era digital que são incapazes de fazer uma viagem à sua interioridade;  homens e mulheres  macerados pelo trabalho  sem sonhos, sem lazer, sem esperança.  O Coração de Jesus se volta para esses todos através de cada um de nós.

      Agir com misericórdia e bondade!  Este o convite do Coração aberto de Jesus a cada um de nós.

Transcrevemos duas reflexões sobre a misericórdia que nos falam muito  do jeito de praticar a bondade para com os outros:

Senhor, se eu tivesse entranhas de misericórdia…
sairia de minha casa para encontrar-me com os necessitados;
de minha apatia para ajudar os que sofrem;
de minha ignorância para conhecer os ignorados;
de meus caprichos para socorrer os famintos;
de minha atitude crítica param compreender os que falham;
de minha suficiência para estar com os incapazes;
de minhas pressas para dar meu tempo aos abandonados;
de minha preguiça para ajudar os cansados de gritar;
de minha burguesia para compartilhar com os pobres.

Quero crer, Senhor,
que o grande é pequeno,
que o último é o primeiro;
que o pobre é o preferido,
que o insignificante é que conta para ti.
Quero crer isto, mas me custa,
porque eu mesmo não vejo
que importem tantas crianças sem hoje.
O mundo pode passar sem elas
e sem notar sua falta.
Senhor, dize-me que a ti te importam, por favor!

Nota:  As duas orações acima transcritas  são de  F. Ulibarri,  citadas por José A. Pagola em  Grupos de Jesus, Vozes, p.  184-185.

quinta-feira, 6 de abril de 2017

Via-Sacra no Devocionário franciscano.

  


Canto inicial: Salve, ó Cristo (n.11 do Devocionário Franciscano)

D. Irmãos, a exemplo de São Francisco, nós meditaremos a Paixão de Jesus Cristo, nosso Salvador e irmão, que no seu amor nos tornou filhos de Deus. Que ao meditarmos sua Paixão, descubramos que nosso caminho é o do amor que dá a vida por seu irmão.

1ª Estação - Jesus é preso e entregue à multidão



D. Depois de preso, Jesus foi levado a Pilatos. Tendo-o recebido, não encontra nele culpa alguma. Lavando suas mãos, entregou-o à multidão. A multidão impaciente quer um espetáculo:

T. Crucifica-o! Crucifica-o!

D. O justo foi condenado; o criminoso foi solto. Ele veio para os seus,

T. Mas os seus não o receberam.

D. Nosso irmão é condenado pelo egoísmo, pela omissão, pela palavra que não constrói a fraternidade.

T. Senhor,/ajudai-nos a reconhecer o vosso rosto desfigurado/ no rosto de todos os irmãos. Onde houver ódio, / levemos o amor.



2ª Estação - Jesus Carrega a Cruz.

D. Coroado de espinhos, o rosto escarrado, sob a zombaria dos soldados, Jesus inicia, com a cruz às costas, o caminho do Calvário.

T. Suas mãos não se cansaram de fazer o bem. Aliviou o peso dos ombros dos homens. Os homens não o reconheceram. Deram-lhe um presente injusto e cruel: a cruz.

D. Perguntarão, então, a Jesus: “Senhor, quando foi que te vimos com fome, sede, peregrino, nu, enfermo, na prisão e não te fomos visitar?” Responderá ele: “Todas as vezes que deixastes de fazer isto a um desses pequeninos, foi a mim que o deixastes de fazer.
T. Senhor, / que nossas mãos sirvam para aliviar o peso dos ombros dos homens, / para construir um mundo de amor. Fazei-nos instrumentos de vossa paz.


3ª estação- Jesus cai pela primeira vez

D. Carregando o madeiro, cambaleando de fraqueza, Jesus cai por terra!

T. Ele deu olhos aos cegos, / ouvidos aos surdos, / pernas aos que estavam caídos. Sua luz tinha brilhado para todos, / mas as trevas não o compreenderam.
D. Embora o peso da cruz fosse do tamanho dos sofrimentos dos homens de todos os tempos, Jesus levanta-se e prossegue seu caminho.

T. Senhor, / em nossa caminhada para a ressurreição, / também caímos. Nossos irmãos também caem. Dai-nos forças para levantar / e prosseguir no caminho que nos leva ao Pai. Onde houver desespero, / levemos a esperança.


4ª estação- Jesus encontra-se com sua Mãe.

D. Mãe e Filho se encontram. Jesus contempla-a: é sua Mãe. Quanta recordação para quem ama! Ela estivera presente em toda a sua vida. Não podia agora faltar.

T. Mãe e Filho caminham para o martírio. Mãe e Filho caminham para o tempo novo. Mãe e Filho caminham para o tempo do amor. Mãe e Filho caminham para a ressurreição.

D. Na estrada da vida, nós nos encontramos com gente que amamos, com gente que nos ama. Mas nossa caminhada para o Cristo não pode parar. “Quem amar o pai ou a mãe, o filho ou a filha, o amigo ou o vizinho mais do que a mim, não é digno de mim”.

T. Senhor, / fazei crescer em nós o espírito de união fraterna, / de serviço e de amizade. O nosso encontro com os outros seja de disposição, / doação e partilha. Onde houver discórdia, / levemos a união.  

5ª Estação - Simão Cireneu ajuda Jesus a carregar a Cruz

D. Simão Cireneu voltava de seu trabalho. Embora cansado, fez-se participante do caminho da Redenção.

T. O Senhor da vida, / o criador de todas as coisas, / precisa da ajuda de um irmão. Precisa de seu tempo. Precisa de suas mãos e de seus ombros.

D. No caminho da vida e da fraternidade, não se anda só. O caminho da cruz e da ressurreição deve ser compartilhado. “Quem diz amar a Deus, mas não ama seu irmão, é mentiroso”.

T. Senhor, / muitas vezes não temos tempo para repartir com nossos irmãos. Deixamos que cada um carregue sua cruz. Onde houver tristeza, / levemos alegria.

6ª estação - Verônica enxuga o rosto de Jesus

D. A face de Deus tinha se transformado com a maldade dos homens. A bondade que ele externara a todos, tinha sido esquecida. No caminho do Calvário, ele é criminoso e deve morrer!

T. Verônica, / a mulher corajosa, / não tem medo de demonstrar sua piedade. Ela quer ver melhor a Deus. Por isso enxuga sua face.

D. O Senhor da face oculta é desvendado nos gestos pequenos. Ele se mostra na bondade e na misericórdia, na ternura e no perdão.

T. Senhor, / pedimos perdão para nosso coração atravancado: / poucos encontram nele a grandeza do amor, / a alegria da dedicação, / a docilidade de quem está pronto para se inclinar. E é assim que mais ocultamos a face viva do nosso Deus. Onde houver trevas, / levemos a luz.

7ª estação - Jesus cai pela segunda vez

D. Jesus tinha novamente a cruz sobre seus ombros. Por isso podia cair uma segunda vez.

T. Todos experimentamos as quedas contínuas. Jesus as assumiu todas. Quer que tenhamos a coragem de nos levantar sempre de novo.

D. O caminho da cruz de cada dia é duro e penoso. São setenta e sete vezes que caímos. Mesmo assim, a cruz não pode ser abandonada.

T. Senhor, / muitas vezes nossa cruz não é carregada com amor. Gostaríamos que ela não existisse. Coragem vos pedimos, Senhor, / na caminhada para a ressurreição. Onde houver dúvidas, / levemos a fé.

Canto: “Eu me entrego, Senhor” (n.10 do Devocionário Franciscano)

8ª Estação - Jesus conversa com as piedosas mulheres

D. Em sua conversa, Jesus exorta. Tem ainda palavras de amor e de afabilidade. Manifesta seu sofrimento: “Não choreis sobre mim, mas sobre vós e vossos filhos”.

T. Somos os homens do diálogo com Deus. Na noite escura é preciso procurar o Senhor. Suas palavras são espírito e vida.

D. Muitos homens são piedosos, mas sua piedade não é fruto do amor. Muitos homens se dizem irmãos, mas não conhecem a generosidade e o perdão.

T. Senhor, / vossa paixão nos convida a viver uma vida nova, / uma vida de encontro. Onde houver erros, / levemos a verdade.

9ª Estação - Jesus cai pela terceira vez.


D. Mais uma queda. Corre o sangue. Como um cordeiro inocente, perde lentamente suas forças.

T. O Deus feito homem, / o Deus feito comunicação, / sofre o desamparo e a solidão.

D. Nós nos tornamos irmãos na medida em que nos amamos. O amor não abandona a ninguém. O amor acolhe a todos.

T. Senhor, / auxiliai-nos. Nunca abandonemos nossos irmãos. Neles nós vos encontramos. Onde houver desespero, / levemos a esperança.

10ª Estação - Jesus é despojado de suas vestes.


D. O Deus que nascera pobre, pobre chega ao fim. O Rei da Criação é desfigurado, é ultrajado. Tratam-no como objeto, como coisa.

T. O Senhor, / antes de morrer, / perdeu tudo: / perdeu nome, honra e fama. Despojam-no de tudo.

D. É fácil destruir um irmão. Difícil é construir a fraternidade. É fácil tirar do irmão o pouco que tem. Difícil é faze-o desabrochar para a vida.

T. Senhor, / que nós saibamos perder a grandeza, o egoísmo, / para que vosso Reino de amor se estabeleça sobre a terra. Queremos amar mais que ser amados.

11ª estação - Jesus é pregado na Cruz


D. Aos poucos o tormento chega ao fim. É sua hora: hora de entrega, hora de consumação. Ele obedece.

T. A zombaria dos inimigos se ergue. Para quem ama, / é hora de confusão.

D. No caminho do amor, todos temos que morrer. Temos que pregar na cruz tudo aquilo que não dá vida aos outros.

T. Senhor, / que nós sejamos como a semente. Colocada na terra, / germine, / cresça e dê frutos. É dando que se recebe, / é perdoando que se é perdoado.

12ª Estação - Jesus morre na cruz.


D. A cruz se levanta; a vida foge. Nas mãos do Pai entrega seu espírito: “Tudo está consumado!”

T. Não há maior amor / que aquele que dá a vida por seus amigos.

(pequeno silêncio)

D. A morte de Cristo nos dá a vida. “Morrendo com ele, com ele ressuscitaremos”.

T. Senhor, / vossa cruz nos acompanha. Não ressuscitaremos se nela não formos pregados. É morrendo que se vive para a vida eterna.

13ª Estação - Maria acolhe o corpo de Jesus.

D. Maria tinha sido a escolhida por Deus para ser a Mãe do Salvador. No Calvário, mais uma vez, acolhe seu Filho como na Encarnação.

T. Somos o templo vivo de Deus. “Quem me acolhe, / recebe aquele que me enviou”.

D. Maria deu Jesus ao mundo. Recebeu-o em seus braços para que pudesse doa-lo constantemente após sua ressurreição.

T. Maria, / que nós possamos ser a tua imagem. Tua dedicação nos ensine a fidelidade ao amor. Procuremos mais consolar / que ser consolados.

14ª Estação - Jesus é posto no túmulo

D. Jesus é a semente! Jesus é a vida que brota!

T. Senhor, / nossa vida também se renove: / cresça na compreensão e no serviço, / seja eterna ressurreição. Procuremos mais compreender que ser compreendidos.



ORAÇÃO FINAL

D. Deus de bondade, meditando a paixão de vosso Filho, compreendemos mais a grandeza de sua dedicação, o amor sem limites que se entregou por nós. Fazei que, unidos na caridade, estejamos sempre mais unidos a vós, que sois Deus e viveis e renais com o Filho, na unidade do Espírito Santo.

T. Amém

Canto: Vitória (n.12) ou Da Bendita Cruz (n.13) ou Bendita e louvada seja (n. 14) ou Vinde, vinde todos (n.15), do “Devocionário Franciscano”.